quarta-feira, 9 de maio de 2012

O mesmo espaço, várias realidades




O final de dia prometia. Como têm prometido os primeiros dias de Maio. As nuvens enchem o céu e chamam por quem gosta de fotografia. Mas não em voz baixa. Gritam para que estejamos lá. Obedeço. Que mais posso fazer?

Tinha outro local como destino, mas precisava de revisitar um espaço ao qual fui há pouco tempo. Necessitava de umas imagens suplementares para um trabalho. Perdi minutos extra que me obrigaram a repensar a ida para qualquer outro sítio. Tomei a decisão que, no momento, me parecia mais correta. Aguardar ali mesmo o pôr do sol.

Mas estava inquieto. Não vislumbrava algo que me chamasse à atenção. O sítio, de certa forma familiar, estava a turvar-me a vista. Precisava de descontrair, de me ligar ao espaço, à luz, à fotografia e esquecer tudo o que me tingia o pensamento. Mas quem disse que este hobby, ou profissão, é fácil?

Eis que sou trespassado por uma imagem de algo com que me cruzei pouco tempo antes. Um trator adaptado, ou apropriado, para trabalhar campos de arroz. Dentro de água poderia oferecer um bom motivo para fotografar. E ali estava ele, dentro de água, ou quase. E o sol pousaria a cerca de 90º dele. A luz quente, lateral, poderia oferecer mais do que aquilo que eu tinha pedido.

Já tinha o motivo, só ainda não tinha a luz. O que fazer? Esperar. Foi o que fiz durante alguns minutos. E esta espera pode muito bem servir para avaliarmos composições, para alinhavarmos ideias, para percebermos como a luz e ambiente se transformam. Isto é tão importante, ou talvez mais, do que o ato de premir o botão de disparo da máquina.

E esta aguardava, pacientemente, em cima do tripé. A brisa é fresca, mas agradável. Ouço outros tratores. Ouço aves. Consigo finalmente estar ligado ao espaço que me rodeia.

O sol começa a ficar baixo e a luz torna-se suave, bonita, quente. Expande-se pelo céu, ilumina nuvens e reflete-se na terra, em tudo o que encontra pelo caminho. A luz por que todos aguardamos, de que todos gostamos. Como aproveitá-la?

Com a máquina no tripé, medição feita, filtros polarizador e ND Grad no sítio, cabo disparador pronto para a ação. O trator começa a ser pintado, lateralmente, pelo tom laranja. As nuvens enchem-se de cor. Guardo o momento. Adoro o barulho do obturador. Lindo. Que mais posso fazer?

A brisa faz a água e nuvens deslocarem-se suavemente. Uma longa exposição pode dar um ar completamente diferente ao cenário. Verifico novamente os valores da exposição. Vou ser radical e usar o Lee Big Stopper, filtro que como é sabido corta 10 stops de luz. O tempo que vou estar a registar o momento vai para lá dos cinco minutos. Seis, para ser mais preciso. Apenas precisaria de uns quatro minutos, mas a luz está a perder força, o que me obriga a prolongar a exposição. E seis pareceu-me que seria suficiente.

Foram longos minutos, mas valeu a pena. Verifiquei o histograma e ali estava ele, certinho. As nuvens perderem volume a arrastaram-se num bailado pelo céu. As natureza como nunca a veríamos só com os nossos olhos. A natureza transformada por um filtro, um simples filtro...



O sol esconde-se, a brisa acalma e em frente a mim tenho um espelho autêntico. Ou quase. Todo este espetáculo acontece e, tenho a certeza, poucas pessoas usufruem do mesmo. E é algo por que não temos de pagar, é de graça. É nestes momentos que lamento pelas pessoas que não veem mesmo vendo. Que não sabem, e provavelmente nunca vão saber, o que perdem, ou o que perderam. Quem se interessa por fotografia, principalmente a de paisagem, aprende a olhar o mundo de outra forma, com mais atenção, com mais respeito, com interesse redobrado. Como é bom estar aqui, envolto neste fenómeno que a mãe natureza me oferece. E por poder guardá-lo, quem sabe para sempre.

Para onde quer que olhe sinto que podia fazer uma excelente imagem. Mas é preciso cuidado com esta suposta facilidade. Encho o meu cartão com mais uma ou outra fotografia e em breve estarei a descarregá-lo para o computador. Tenho a certeza de ter conseguido algumas fotografias interessantes.

A edição tornou-se fácil. Não gosto de perder muito tempo com cada imagem. Ou sai logo mais ou menos bem do cartão, ou passo à frente. No Lightroom limpei uma ou outra sujidade, acertei ligeiramente o balanço de brancos (nem em todas foi necessário), um toque de saturação (pouco para não enjoar, já que a natureza a esta hora me ofereceu cores fortes), contraste através do gráfico de níveis, porque é mais eficiente do que a opção pura de contraste e ajuste do sharp. Cataloguei e arquivei. Por hoje está. Que chegue amanhã, ou depois, ou quando se proporcionar.

Como é bom fotografar...


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